é difícil a cidade. os anos passaram e a incredulidade ampliou-se até ao inimaginável. sente-se deslocado daquele mundo em que está mas por contingências das suas responsabilidades de vida adulta já não mais partilha.
os transportes públicos hoje estão mais livres, mesmo assim as pessoas insistem em encolher-se no seu canto (talvez o hábito quotidiano) e que mentalmente agradecem por não ser hora de ponta e por poderem ir sentadas e não ter de tocar nos apoios onde muito eventualmente estará uma bactéria que hipoteticamente será a causadora de uma gripe qualquer; agradecem também decerto pela fraca afluência de gente não lhes trazer o cheiro mal cuidado no final de um dia de trabalho que as faz respirar pela boca, aliás a pseudo-gripe até que vem a calhar e assim se pode usar comodamente uma máscara sobre o nariz sem levantar suspeita ao vizinho do lado. mas o espaço traz inevitavelmente a voz do mendigo (não se atreveria numa outra ocasião), vale tudo pela esmolinha, esquece de guardar o seu telemóvel na mala para que não surjam suspeitas e o copo vai vazio, e a desconfiança cresce. sai numa estação que tão bem conhece mas todas as ruas se modificaram.
os cheiros impuros e poluídos provocam-lhe ardor nos olhos e comichão no nariz. a visão turva pelas lágrimas torna-lhe difícil identificar o sítio para onde pretende ir. as pessoas apressadas, riem alto e parecem felizes. (a pressa que tem, partilha-a com a cidade, foi algo que nunca o deixou desde a sua primeira incursão pela vida citadina. instalou-se-lhe a pressa de chegar, sempre lhe falta o tempo para o que gostaria de ter feito ontem.) os divertimentos antigos pouco lhe dizem, não sabe das exposições ou dos filmes que estão no cinema, não conhece o último videoclip da banda da moda da cultura alternativa, não conhece os bares do momento, não entende os anúncios publicitários amontoados pelas paredes grafitadas e em ruínas. não entende como a vida na cidade se transformou num romance foleiro que leu há anos e que lhe pareceu ridículo e fútil.
pensando melhor procura ir para aquela cidade que encontrou há dois anos. não era mais bonita, não era menos cinzenta, talvez fosse mesmo quase igual ao que é hoje – mas ele era diferente e ele queria fixar-se apenas um momento mais naquela memória solitária onde ele teria menos dois anos de responsabilidades, menos dois anos de preocupações e angústias e mais dois anos de sonhos.
os transportes públicos hoje estão mais livres, mesmo assim as pessoas insistem em encolher-se no seu canto (talvez o hábito quotidiano) e que mentalmente agradecem por não ser hora de ponta e por poderem ir sentadas e não ter de tocar nos apoios onde muito eventualmente estará uma bactéria que hipoteticamente será a causadora de uma gripe qualquer; agradecem também decerto pela fraca afluência de gente não lhes trazer o cheiro mal cuidado no final de um dia de trabalho que as faz respirar pela boca, aliás a pseudo-gripe até que vem a calhar e assim se pode usar comodamente uma máscara sobre o nariz sem levantar suspeita ao vizinho do lado. mas o espaço traz inevitavelmente a voz do mendigo (não se atreveria numa outra ocasião), vale tudo pela esmolinha, esquece de guardar o seu telemóvel na mala para que não surjam suspeitas e o copo vai vazio, e a desconfiança cresce. sai numa estação que tão bem conhece mas todas as ruas se modificaram.
os cheiros impuros e poluídos provocam-lhe ardor nos olhos e comichão no nariz. a visão turva pelas lágrimas torna-lhe difícil identificar o sítio para onde pretende ir. as pessoas apressadas, riem alto e parecem felizes. (a pressa que tem, partilha-a com a cidade, foi algo que nunca o deixou desde a sua primeira incursão pela vida citadina. instalou-se-lhe a pressa de chegar, sempre lhe falta o tempo para o que gostaria de ter feito ontem.) os divertimentos antigos pouco lhe dizem, não sabe das exposições ou dos filmes que estão no cinema, não conhece o último videoclip da banda da moda da cultura alternativa, não conhece os bares do momento, não entende os anúncios publicitários amontoados pelas paredes grafitadas e em ruínas. não entende como a vida na cidade se transformou num romance foleiro que leu há anos e que lhe pareceu ridículo e fútil.
pensando melhor procura ir para aquela cidade que encontrou há dois anos. não era mais bonita, não era menos cinzenta, talvez fosse mesmo quase igual ao que é hoje – mas ele era diferente e ele queria fixar-se apenas um momento mais naquela memória solitária onde ele teria menos dois anos de responsabilidades, menos dois anos de preocupações e angústias e mais dois anos de sonhos.
1 comentário:
mais fácil é diluir-se no romance piroso da cidade que resistir-lhe. ou sobreviver-lhe.
que bom é ler-te a espaços, contador de histórias.
* m
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